quinta-feira, 26 de junho de 2014

Lei Seca é suspensa durante a Copa

Fiscalizações diárias desapareceram após o início do Mundial. Foto: Renato Cobucci

Lei Seca é suspensa durante a Copa


Danilo Emerich

Enquanto as forças policiais de Minas Gerais se concentram em garantir a “segurança” dos brasileiros e estrangeiros durante a Copa do Mundo, a população e turistas passaram a correr um outro tipo de risco. Desde que começou a competição internacional, as blitz da Lei 11.705/2008, também conhecida como “Lei Seca”, foram praticamente extintas da ruas e avenidas de Belo Horizonte.

A interrupção da fiscalização é admitida pela Secretaria de Estado de Segurança Pública (Seds). Em nota, o órgão informou que “durante a Copa do Mundo, houve reposicionamento de vários policiais militares, entre eles os pertencentes ao Batalhão de Trânsito, para reforço das atividades de policiamento ostensivo em toda a cidade. As ações de Lei Seca continuam sendo realizadas, porém o combate à criminalidade, rondas e abordagens têm sido atividades prioritárias durante o Mundial”.

Na perfil do twitter da Seds, onde são divulgados os resultados da operações da campanha “Sou pela Vida. Dirijo sem Bebida” (https://twitter.com/soupelavida) - que são diárias desde 14 de julho de 2011 em BH – a última atualização foi realizada em 18 de junho, mas com dados de até 11 de junho, um dia antes do início da Copa do Mundo.

Foi feito um pedido para a assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Defesa Social informar os números do dias seguintes, que não teve retorno até 26 de junho.

PERIGO
Taxistas ouvidos pelo Blog Um Outro Olhar para Belo Horizonte informaram que, de fato, perceberam o fim das fiscalizações após a Copa do Mundo. Junto com a inexistência da fiscalização, eles também relatam a percepção de um aumento de motoristas dirigindo de forma perigosa, agressiva e também de acidentes.

O risco maior, são os milhares de turistas e de belo horizontinos, que participam todos os dias de festas espalhadas na capital mineira - seja na Savassi, na Fan Fest, realizada na Expominas, ou mesmo no Estádio Mineirão. O que se tem visto, nos dias de jogos, principalmente da seleção brasileira, são pessoas consumindo bebidas alcoólicas e depois pegando a direção, sem encontrar nenhuma fiscalização.

Milhares de pessoas comemoram e bebem na Savassi durante os jogos da Copa. Muitos dirigem após consumir álcool. Foto: Leonardo Morais
BALANÇO
Segundo os dados da Seds, entre 14 de julho de 2011 e 31 de maio de 2014, a blitz diárias da campanha “Sou pela Vida. Dirijo sem Bebida”, em Belo Horizonte, abordou 125.364 veículos e registrou 1.285 crimes de trânsito (condutores com nível de álcool no sangue acima de 0,34 mg/l) e outras 3.113 infrações de trânsito (condutores com índice de álcool no sangue entre 0,05 e 0,33 mg/l).

Além disso, desde que a recusa de assoprar bafômetro, passou a ser passível de punição administrativa, em 5 de agosto de 2011, até 31 de maio deste ano, 1.324 pessoas preferiram não passar pelo teste.

Já com base nas informações do twitter da campanha “Sou pela Vida. Dirijo sem Bebida”, entre 1 de junho e o dia 11 do mesmo mês, foram 2.056 veículos abordados, ou seja, média de 186 por dia. Nesse período, uma pessoa estava com nível de álcool no sangue acima de 0,34 mg/l e responderá à processo criminal. Outras sete pessoas estavam com índice de álcool no sangue entre 0,05 e 0,33 mg/l. Além disso, 72 pessoas foram flagradas dirigindo sem possuir a Carteira Nacional de Habilitação (CNH).

O QUE DIZ A LEI
Em 19 de junho de 2008, foi aprovada a Lei 11.705, que modificou o Código de Trânsito Brasileiro. A regra foi apelidada de “Lei Seca”, pois proíbe o consumo da quantidade de bebida alcoólica superior a 0,1 mg de álcool por litro de ar expelido no exame do bafômetro por condutores de veículos, ficando o condutor transgressor sujeito a pena de multa, a suspensão da carteira de habilitação por 12 meses e até a pena de detenção, dependendo da concentração de álcool por litro de sangue.

Em 20 de dezembro de 2012 foi aprovada a Lei 12.760, que modificou novamente a regra e eliminou a margem de tolerância de quantidades para a aplicação de penalidades administrativas e fixando em 0,34 mg de álcool por litro de sangue como o valor inicial a ser considerado crime. A norma ainda prevê a utilização de vários meios de prova para incriminar o condutor, além da declaração do agente de polícia, como testemunhas, vídeos, entre outros métodos.

domingo, 15 de junho de 2014

Copa aquece mercado do sexo em Belo Horizonte

Copa aquece mercado do sexo em Belo Horizonte


Danilo Emerich

A oportunidade para aumentar os lucros trará mais de 2 mil mulheres e travestis para se prostituirem durante a Copa do Mundo em Belo Horizonte. Profissionais do sexo, iniciantes ou veteranas, de todos os cantos do país e até do exterior, chegam à capital mineira desde o início de maio. O chamariz são os 160 mil turistas previstos em BH para acompanhar o evento internacional, que devem movimentar a economia da cidade.

Não há um controle sobre o número de profissionais do sexo que virão para BH. A estimativa é da Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aspromig). A maioria delas deverá trabalhar com anúncios em sites de acompanhantes, em boates de strip-tease de luxo, casas de prostituição ou em pontos conhecidos da atividade, como a avenida Afonso Pena, e na Orla da Lagoa da Pampulha. De olho no crescimento da demanda, o valor cobrado pelo programa também inflacionou. Saltou de R$ 150 a R$ 250 a hora para até R$ 500.

Prostitutas chegam em BH para a Copa do Mundo. Foto: Flávio Tavares
Percorremos os locais mais conhecidos de prostituição de BH durante o último mês e apuramos sobre a vinda dessas mulheres e travestis para a Copa do Mundo e a situação que chegaram, enfrentando, por vezes, a exploração sexual e o trabalho em condições análogas à escravidão.

OPORTUNIDADE
Uma das mulheres que enxergaram na Copa uma chance de ganhar dinheiro extra é Michele*, de 26 anos. A morena de seios siliconados afirma ser novata no ramo. Conta ter saído da capital do Ceará, onde trabalhava em uma concessionária de veículos, e chegado à capital mineira há três semanas, onde trabalha agora em uma boate de luxo na rua Rio Grande do Norte, bairro Funcionários, região Centro-Sul de Belo Horizonte.

Desde que desembarcou na cidade, Michele vive em um apartamento alugado no Centro. Cobra R$ 300 a hora. “Vou só juntar uma grana para comprar meu carro e vou parar depois da Copa. Senão, acabo viciando, pois é um dinheiro fácil”, afirma Michele, que garante ter sentido culpa após o primeiro programa.

Mineira de Juiz de Fora, Babi*, de 27 anos, também aproveitou a oportunidade gerada pelo Mundial. Ela deixou a cidade natal no último dia 2 e trabalha em uma boate na Savassi. “A casa (boate) mantém uma pensão no bairro São Lucas para ficarmos. Lá dormem cerca de 30 mulheres, muitas vindas do interior do Estado”, revelou.

Além de mulheres, cresceu o número de travestis em Belo Horizonte em busca de melhorar a renda durante a Copa.

Gisele*, de 29 anos, já fazia programas em Ipatinga, no Vale do Aço, e chegou a Belo Horizonte agenciada por uma mulher. A “oferta” para morar e trabalhar em um quarto numa mansão na orla da Pampulha a atraiu. Outras seis travestis também teriam aceitado a proposta.

Segundo a presidente da Aspromig, Cida Vieira, há várias garotas vindas da Colômbia, Venezuela, Chile e Estados Unidos.

A baiana Rawany*, de 18 anos, que anuncia seus serviços em um site de acompanhantes de luxo há cerca de um mês, hospeda uma amiga da Espanha, que também veio para a capital fazer programas.

FISCALIZAÇÃO
O Ministério Público Estadual (MPE) afirmou não atuar em casos de prostituição, exceto quando envolve crianças e adolescentes, além da exploração da atividade por terceiros. Em setembro do ano passado, segundo a assessoria do MPE, os proprietários de um site de acompanhantes foram denunciados, com base em investigação feita da Polícia Civil.

Segundo o juiz da Vara Cível da Infância e Juventude de BH, Marcos Flávio Lucas Padula, as diligências para inibir a exploração sexual de crianças e adolescentes, além de outros crimes, como o consumo de bebidas alcoólicas por menores de idade, foram intensificadas durante o Mundial.

“Com o aumento de turistas, o turismo sexual cresce junto. A Copa não criou o problema, mas sim a presença maior de estrangeiros no período. Estamos atentos a essa questão e vamos coibir o máximo possível”, afirmou Padula. (*Nomes fictícios)

Preparação incluiu até cursos de inglês
Assim como hotéis, restaurantes e comércio se prepararam para receber bem os turistas em Belo Horizonte durante a Copa do Mundo, as profissionais do sexo também se capacitaram para prestar o melhor “atendimento” possível à clientela.

Segundo a presidente da Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aspromig), Cida Vieira, foram oferecidos cursos de inglês básico para mais de 300 garotas, e uma cartilha de idiomas, com frases elementares, será lançada nos próximos dias para facilitar a conversa e a eventual negociação de um programa.

“Também estamos iniciando uma campanha de orientação sobre doenças sexualmente transmissíveis e as maneiras de evitá-las”, informou a presidente da Aspromig.

Cida Vieira diz ainda que, atualmente, há cerca de 500 mil profissionais do sexo atuando em Minas Gerais, sendo 80 mil em Belo Horizonte.

“É importante ressaltar que a prostituição não é crime, mas a exploração sexual. Não aceitamos adolescentes e denunciamos qualquer caso de tráfico de pessoas”, garante.


Restante da reportagem:
Inocência ameaçada

O prazer explorado

As casas do sexo


Exploração tende a crescer

Tráfico de pessoas e trabalho escravo também podem crescer durante a Copa

Inocência ameaçada


Crianças e adolescentes mais vulneráveis durante a Copa. Foto: Leonardo Morais

Inocência ameaçada


Danilo Emerich

Entre janeiro a março deste ano, pelo menos 15 crianças ou adolescentes foram abusadas ou exploradas sexualmente de alguma forma em Minas Gerais por dia, segundo a Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds). O temor é que a presença dos 160 mil estrangeiros para a acompanhar a Copa do Mundo aumente os crimes contra menores de 18 anos em Belo Horizonte.

Entre janeiro a março deste ano, foram 1.421 registros de crimes conta a dignidade sexual contra menores de 18 anos em Minas Gerais. No mesmo período do ano passado, foram 1.502 casos. Já o comparativo entre os últimos dois anos, foram 5.915 ocorrências em 2012 contra 5.735 em 2013.

Durante um mês, percorremos os locais mais conhecidos de prostituição de BH, durante o último mês. A maior presença de turistas na cidade durante o evento internacional é o chamariz para mais de 2 mil prostitutas virem de todos os cantos do país e até de outros países,, segundo estimativa da Associação das Prostitutas de Minas Gerais (Aspromig).

Garotas de programa, maiores de 18 anos, que conversaram com a reportagem relataram que adolescentes também aproveitarão a oportunidade para venderem o corpo. No entanto, elas estão falsificando identidades para trabalharem em boates de strip-tease, casas de prostituição e com anúncios de acompanhantes em sites na internet.

PROTEÇÃO
O cenário de aumento dos casos é esperado pelo juiz da Vara Cível da Infância e Juventude da Comarca de Belo Horizonte, Marcos Flávio Lucas Padula. Ele ordenou os comissários do juizado a intensificação das diligências para inibir a exploração sexual de crianças e adolescentes, além de outros crimes, como o consumo de bebidas alcoólicas.

“Com o aumento de turistas, o turismo sexual aumenta junto. A Copa do Mundo não criou o problema, mas é devido a presença maior de estrangeiros no período. Estamos atentos a essa questão e vamos coibir o máximo possível”, afirmou Marcos.

Menores falsificam identidade para se prostituirem. Foto: Toninho Almada
HISTÓRICO
A vice-presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, Regina Helena Cunha Mendes, diz que nas duas últimas edições da Copa do Mundo, na Alemanha e África do Sul, houve um grande aumento da incidência de trabalho infantil, desaparecimento, gravidez e exploração sexual de crianças e adolescentes.

“Estamos trabalhando na prevenção e na garantia dos direitos delas, assim como o Brasil inteiro. Não queremos que isso ocorra aqui. O risco de casos da exploração sexual é grande. A imagem do Brasil durante muito tempo foi a de paraíso sexual e turistas podem vir com essa imagem”, alerta Regina.

Os telefones para a denúncia de casos de crimes contra crianças e adolescentes são o Disque 100 e o 08000311119.

DISQUE 100
O principal canal de denúncias de crimes contra crianças e adolescentes no Brasil, o Disque 100, recebeu, no último ano, 18.678 ligações de ocorrências apenas presenciadas em Minas Gerais. A maior parte dos chamados é quanto a violência sexual (2.692) e a exploração do trabalho infantil (746).

No entanto, o dado que mais chama a atenção das denúncias é o tráfico de pessoas. Das 186 ligações de todo o país, Minas foi responsável por 22 (11%) dos casos. O número total de telefonemas entre os anos de 2012 e 2013 se manteve quase o mesmo, cerca de 19 mil. Os dados são da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), vinculado a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos.

CRITICA
Para o deputado federal e ex-presidente da CPI do Tráfico de Pessoas na Câmara dos Deputados, Arnaldo Jordy, encerrada no último mês, espera-se uma explosão dos casos de crimes contra crianças e adolescentes, principalmente de exploração sexual. “Há poucos mecanismos de prevenção e proteção. O pior ato foi dispensar as crianças das aulas em dias de jogos da copa, deixando elas ociosas e ainda mais expostas. O combate fica restrito a denúncia, pouco investigados pelos órgãos competentes”, afirmou o deputado Jordy.

NÚMEROS
84 denúncias foram feitas ao Disque 100 em 2013 de casos de exploração sexual no turismo de crianças e adolescentes no Brasil. Dois dos casos foram em Minas Gerais.

22% das denúncias do Disque 100 de violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil são de exploração sexual. Em 2013 foram 7.217 ligações, de um total de 35.091, sendo 600 casos em Minas Gerais.

Números Disque 100
2011
Tipo
Minas Gerais
Brasil
Abuso financeiro e econômico
11
97
Exploração do trabalho infantil
176
2.241
Trabalho escravo
1
17
Tráfico de pessoas
1
17
Violência sexual
2.269
28.525
Total de denúncias em 2011
10.988
160.874
2012
Abuso financeiro e econômico
74
1.107
Exploração do trabalho infantil
827
6.488
Trabalho escravo
4
58
Tráfico de pessoas
4
100
Violência sexual
3.182
337.726
Total de denúncias em 2012
18.664
261.889
2013
Abuso financeiro e econômico 80 1.204
80
1.204
Exploração do trabalho infantil 746 9.942
746
9.942
Trabalho escravo 6 78
6
78
Tráfico de pessoas 22 186
22
186
Violência sexual 2.692 31.895
2.692
31.895
Total de denúncias em 2013
18.678
248.424
FONTE: Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) – Disque 100

O prazer explorado

Hotéis também oferecem serviço de garotas de programa. Foto: Renato Cobucci.

O prazer explorado


Danilo Emerich

Belo Horizonte não será apenas a capital do futebol em Minas Gerais durante a Copa do Mundo. A vinda de 160 mil estrangeiros para o evento também transformará a cidade na sede mineira da indústria do sexo. Por trás desse mercado do prazer, autoridades também esperam um grande aumento da exploração da prostituição de crianças, adolescentes e adultos, além do tráfico de pessoas e trabalho escravo.

Para alimentar essa demanda, cerca de 2 mil mulheres e travestis desembarcam em BH desde maio para se prostituírem, conforme a estimativa da presidente da Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aspromig), Cida Vieira. As profissionais do sexo, iniciantes ou veteranas, chegam de todas as partes do Estado, do país e até de outros países.

Percorremos, durante todo o mês de maio, os locais mais conhecidos de prostituição da capital mineira para apurar as condições que elas chegam e trabalham. Mesmo com campanhas do governo para evitar o turismo sexual e de conscientização sobre a importância da denúncia, o cenário encontrado foi a desinformação das prostitutas de seus direitos, sendo exploradas por terceiros, cenário que tende a aumentar durante a Copa.

COBRANÇA
Uma das formas mais comuns da exploração da prostituição em BH está nas boates de strip-tease, onde o valor da entrada chega a R$ 90 (O valor foi elevado com a chegada da Copa). Lá dentro, mulheres seminuas dançam e oferecem programas. Além dos preços abusivos no cardápio (uma lata de cerveja chega a custar R$ 15), todas as casas também lucram com a saída das prostitutas. Se um cliente quiser levar a garota para outro local, é obrigado a pagar uma taxa extra para a casa, que alcança até R$ 100.

Durante a visita da reportagem no local, dois policiais militares fardados entraram no local, tomaram cerveja, mexeram com as prostitutas e depois foram embora. Um garçom revelou que a presença da dupla era frequente na casa.

Programas também são realizados dentro de boate na Savassi. Foto: Reprodução.
Babi, de 27 anos trabalha em uma das boates na região da Savassi, onde também são realizados programas no local. Ela veio de Juiz de Fora para BH, em 2 de junho, em função da Copa do Mundo. Segundo ela, a boate mantêm uma pensão no bairro São Lucas, onde dormem cerca de 30 mulheres.

“É ruim ficarmos lá. As camas são ruins. Ganhamos a alimentação e podemos sair quando quisermos, mas pagamos R$ 12 por dia que ficamos lá e temos que trabalhar exclusivamente para o lugar por seis dias, com direito de um dia de folga”, revela a prostituta. O mesmo esquema foi constatado outra boate no bairro Floresta, na região Leste de BH.

Na saída das boates, sempre há a presença de um taxista. Quando o programa é pago por cartão, alguns deles oferecem a própria máquina, mas com a cobrança de uma comissão de 20% do valor. A prática é proibida pela BHTrans, órgão fiscalizador e gestor do trânsito em Belo Horizonte.




As casas do sexo

Prostitutas pagam até metade do valor do programa para cafetinas. Foto: Reprodução

As casas do sexo

Danilo Emerich

Em vários sites de anúncio de acompanhantes de luxo, as garotas de programa avisam atender os clientes em motéis, hotéis, residências e também nos chamados “privês”. Estes últimos, são casas ou apartamentos, de preferência próximo do Centro de Belo Horizonte, e controlados por cafetões ou cafetinas.

Uma prostituta chamada Daniela, que dizia ter 18 anos, mas aparentava ter menos idade, mantinha a propaganda na internet. A baiana conta que começou a fazer programas há cinco meses. Antes de fazer programas com anúncios na internet, ela diz ter trabalhado em um desses privês. Segundo Daniela, a casa está localizada na rua Mucuri, no bairro Floresta, região Leste de BH.

“Saí de lá pois a cafetina, chamada Renata, pegava metade do dinheiro dos programas. Queria que trabalhássemos todos os dias e se saíssemos durante o dia, dizia que naquele tempo poderíamos ter feito mais clientes. Até para buscar lanches para nós ela cobrava muito mais”, denunciou.

A jovem disse que muitas meninas são recrutadas nos hotéis na região da rua Guaicurus, no Centro e aceitam a condição, pois tem medo de voltar para a origem.

OPERAÇÃO
No último dia 11 de junho, a Polícia Civil conseguiu estourar uma dessas casas, onde ocorria a exploração da prostituição. Os proprietários da casa, conhecida como “Boate Fascinação”, no bairro Santo Agostinho, região Centro-Sul de Belo Horizonte, foram presos na operação. Os donos do imóvel Maria de Souza Sá e José Carlos Souza Sá, além do gerente Marcos Roberto Pereira, foram encaminhados para a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) e irão responder por prática dos crimes de induzir pessoas à prostituição, manter estabelecimento de prostituição e tirar proveito de prostituição alheia.

Segundo a Polícia Civil, mo momento da ação, cerca de 15 mulheres estavam no imóvel, disponíveis para programas. Pelo menos quatro casais ocupavam diferentes quartos do estabelecimento na hora do flagrante. Os clientes pagavam R$ 60 para entrar na boate e uma média de R$ 270 por programa. 

Segundo o coordenador do Projeto de Combate ao Trabalho Análogo ao de Escravos da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Minas Gerais, Marcelo Campos, “a existência do direito de ir e vir não descaracteriza crimes da exploração da prostituição, sexual, tráfico de pessoas ou o trabalho escravo”.

ALUGUEL
Outra situação encontrada pela reportagem da exploração da prostituição é a cobrança de aluguel dos pontos nas ruas onde garotas de programa e travestis aguardam os clientes. Motoqueiros vigiavam e chegavam a cobrar cerca de R$ 40, segundo as garotas de programa, por pessoa em locais como a avenida Afonso Pena ou na Orla da Lagoa da Pampulha.

Já a atividade exercida por prostitutas na rua Guaicurus não é considerada ilegal, Segundo o coordenador do Projeto de Combate ao Trabalho Análogo ao de Escravos da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Minas Gerais, Marcelo Campos. Ele diz que uma vez que as mulheres locam o espaço para realizar o programa, não repassando o valor para nenhum terceiro, não há configuração de crime.

Prostituição não é crime no Brasil, mas a exploração por terceiros sim.
LEGISLAÇÃO
Pela lei brasileira, a prática da prostituição seja por mulher ou homem adulto não caracteriza crime. No entanto, a prática de condutas que favoreçam ou explorem comercialmente essa atividade de outra pessoa caracterizam o crime previsto no artigo 228 do Código Penal.

A manutenção de um local onde se explore a prostituição e o rufianismo também caracterizam crimes, previstos no artigo 229 e 230 do Código Penal. Já a intermediação, transporte e alojamento de quem será explorado para a prostituição caracteriza o tráfico de pessoas, capitulado no artigo 231 A do Código Penal.

CAMPANHAS
O Ministério do Turismo lançou uma campanha com foco no setor hoteleiro e turístico para evitar o turismo sexual. Um manual foi preparado com orientações para a proteção da criança e do adolescente em situação de risco. Além disso, o governo também firmou parceria com a Secretaria Especial de Direitos Humanos para a divulgação da campanha “Proteja – Não desvie o olhar” e incentivar as denúncias pelo Disque 100.

Já a Secretaria de Estado de Turismo e Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social criaram em Minas Gerais o projeto “Proteja Nossas Crianças”, divulgando o número 0800 031 1119. Neste ano, até 25 de março, o telefone recebeu 572 denúncias de violações de direitos de crianças e adolescentes. No mesmo período do ano passado, os casos de denúncias chegaram a 514.




Exploração tende a crescer

Exploração tende a crescer


Danilo Emerich

Junto com a vinda de quase 2 mil profissionais do sexo para Belo Horizonte durante a Copa do Mundo, os casos de exploração da prostituição encontrados pela reportagem também tendem a crescer durante a Copa do Mundo. A previsão é do deputado federal e ex-presidente da CPI do Tráfico de Pessoas na Câmara dos Deputados, Arnaldo Jordy, comissão encerrada em maio. Ele diz que o combate é um grande desafio, pois, muitas vezes, as vítimas não se reconhecem como tal.

“Sem a participação da população, é quase impossível para o Estado agir. É preciso criar uma legislação mais completa e tornar o comércio de humanos como crime hediondo. Não há um cadastro único nacional e na Copa do Mundo os casos vão aumentar muito, principalmente de exploração sexual”, afirmou citando o Projeto de Lei (PL) 6934/2013 que altera e qualifica outras leis, além de endurecer penas.

Na maior parte dos casos, vítimas não se reconhecem como vítimas de exploração. Foto: Reprodução.

COMBATE
Segundo o coordenador do Projeto de Combate ao Trabalho Análogo ao de Escravos da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Minas Gerais, Marcelo Campos, os casos encontrados caracterizam a exploração da prostituição, quando terceiros tiram proveitos de programas sexuais feitos por uma pessoa.

“Os fatos sugerem a necessidade de um enfrentamento multi institucional do problema. Apresentarei os casos na próxima reunião do Comitê Interinstitucional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas do Estado de Minas Gerais”, afirmou Campos.

Ele diz que não há dados concretos sobre o aumento da exploração sexual. “Somente é caracterizado crime quando há a presença de crianças ou adolescentes, além do favorecimento de terceiros”, disse o coordenador.

Procurado, o Ministério Público Estadual afirmou que não há nenhuma investigação em curso sobre a exploração da prostituição em BH. Em setembro do ano passado, o MP denunciou os proprietários de um site de acompanhantes, com base em investigações da Policia Civil.

Dados da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds) apontam um pequeno número de registros para os tipos de crimes, com vítimas maiores de 18 anos. Em 2013, em Minas Gerais, foram registrados quatro casos de casas de prostituição, sendo apenas um em Belo Horizonte e outros dois de exploração da atividade. Nenhum caso de rufianismo foi flagrado.

Já no ano anterior, nenhuma casa de prostituição, mas foram encontrados dois de favorecimento e dois de rufianismo (tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros, ou cafetinagem). Além disso, nenhum caso de tráfico de pessoas nacional ou internacional em Minas Gerais foi registrado pelas forças de segurança no Estado.




Tráfico de pessoas e trabalho escravo também podem crescer durante a Copa

O foco do tráfico de pessoas durante a Copa poderá ser entre estados. Foto: Reprodução.

Tráfico de pessoas e trabalho escravo também podem crescer durante a Copa


Danilo Emerich

Um dos principais temores de autoridades é o aumento do tráfico de pessoas em função da Copa do Mundo. O tema chegou a ser debatido na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) em 8 de maio, mas o combate do crime se restringe a projetos de lei em lenta tramitação na Câmara dos Deputados e no Senado, campanhas de conscientização e investigação dos poucos casos que chegam ao conhecimento das forças de segurança.

Para a Copa do Mundo, casos de tráfico de pessoas começaram desde o início de maio em Minas Gerais. Em Ipatinga, no Vale do Aço, uma travesti chamada Gisele revelou um esquema do tráfico de pessoas para BH, com fins de exploração sexual.

Segundo ela, uma mulher chamada Cláudia cobrava cerca de R$ 2 mil para travestis virem para a capital mineira e ficarem instaladas em uma mansão na Orla da Pampulha, onde fariam os programas. “Se chegasse o dia da viagem e se elas tivessem pago todo o valor, por exemplo, faltar R$ 400, podiam viajar, mas passavam a dever R$ 800. Parte dinheiro dos programas ficava com a casa. Foram as condições que me ofertaram, mas decidi não ir”, disse.

Gisele também afirmou ter trabalhado na Praça da Cemig, em Contagem, em 2013, onde uma travesti chamada Samantha cobra aluguel dos pontos na região. “Se houvesse qualquer discussão, ela multava, tomava os bens, batia e chegava a deixava pessoas presas”, revelou.

SUBNOTIFICAÇÃO
Em Minas Gerais, a Polícia Federal registrou, entre 2005 e 2011, 1.075 ocorrências ligadas a comercialização do ser humano. Porém, o número real é muito maior, devido a subnotificação. Segundo relatórios do Ministério da Justiça e da ONU, estima-se cerca de 2,45 milhões de pessoas traficadas por ano no mundo, movimentando um mercado de US$ 32 bilhões.

Para o coordenador especial de Prevenção à Criminalidade da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), Talles Andrade de Souza, a subnotificação é real, mas as estimativas são “fantasiosas”. Ele cita previsões do tráfico de pessoas em eventos, como a Olimpíadas de Inverno em 2010, no Canadá, e as Copas do Mundo da Alemanha e África do Sul, “mas os números não foram confirmados pelos governos locais”.

Desde que foi criado, há um ano e meio, o núcleo mineiro acompanhou 42 casos suspeitos envolvendo 347 pessoas. “A confirmação só se dá por meio jurídico. Não basta a regularização de uma exploração laboral, por exemplo. É preciso investigar a origem, de como essa pessoa chegou lá”, afirmou Talles.

Denuncie: Ligue 100
INVESTIGAÇÕES
A Polícia Federal, entre 2010 e 2013, instaurou 53 inquéritos em Minas Gerais para apuração de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual, sendo que 28 destes em Belo Horizonte, 13 na região de Governador Valadares e os demais distribuídos por todas as outras cidades.

Com relação às investigações sobre trabalho escravo, no mesmo período, a PF investigou 167 inquéritos, sendo 49 em BH e 43 em Uberlândia. Ainda entre 2010 e o último ano, foram instaurados 19 inquéritos com o fim de apurar o envio de crianças para o exterior ou a fuga de genitor com filho sem autorização do outro genitor.

Em nota, a Polícia Federal informou que está atenta a esses tipos de crimes e sempre investiga qualquer denúncia.

NÚMEROS
475 brasileiros foram vendidos para fora do país, entre 2005 e 2011, segundo a Polícia Federal.

337 casos eram destinados a exploração sexual. A maioria delas adolescentes e mulheres até 29 anos, solteiras, de baixa escolaridade, oriundas de zonas urbanas.